Astrônomos estão utilizando explosões rápidas de rádio — clarões intensos e de milissegundos de duração vindos do espaço — para localizar parte da matéria comum que estava “desaparecida” no universo.
A maior parte do cosmos é composta por matéria escura e energia escura. A matéria escura é uma substância invisível que molda a estrutura do universo, enquanto a energia escura impulsiona a expansão acelerada do espaço, segundo a NASA. Apesar de não poderem ser observadas diretamente, ambas são detectadas por seus efeitos gravitacionais.
Mas além dessas componentes misteriosas, o universo também é formado por matéria bariônica, ou matéria comum, composta por partículas como prótons e nêutrons.
“Se somarmos todas as estrelas, planetas e gases frios visíveis pelos telescópios, isso representa menos de 10% da matéria comum do universo”, explicou Liam Connor, professor assistente de astronomia da Universidade Harvard.
Durante anos, os astrônomos acreditaram que a maior parte dessa matéria comum estava espalhada pelo meio intergaláctico — a região entre as galáxias — ou nos halos galácticos, áreas esféricas que cercam as galáxias e contêm estrelas e gases quentes. No entanto, essa matéria se mostrou difícil de detectar. Embora a matéria comum emita luz em diferentes comprimentos de onda, grande parte dela é tão difusa que se assemelha a uma névoa invisível.
Essa dificuldade em observar cerca de metade da matéria comum do universo gerou o chamado “problema dos bárions desaparecidos”, uma questão que intrigou os cosmólogos por décadas.
Agora, Connor e seus colegas conseguiram observar diretamente essa matéria usando os clarões das explosões rápidas de rádio como uma espécie de radar cósmico, revelando o que antes era invisível. Os resultados foram publicados recentemente na revista Nature Astronomy.
“As FRBs atravessam a névoa do meio intergaláctico e, ao medir com precisão como a luz desacelera ao passar por ela, conseguimos pesar essa névoa, mesmo quando ela é fraca demais para ser observada diretamente”, afirmou Connor, autor principal do estudo. Parte da pesquisa foi conduzida enquanto ele ainda era assistente de pesquisa no Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech).
No futuro, os cientistas esperam utilizar essas explosões para mapear a estrutura invisível do universo com ainda mais detalhes.
Clarões que desvendam o universo
Desde que foram descobertas em 2007, mais de mil explosões rápidas de rádio já foram detectadas. No entanto, apenas cerca de 100 delas foram rastreadas até suas galáxias de origem. A origem exata dessas explosões ainda é um mistério, mas encontrar mais delas pode esclarecer os processos que as causam.
Para estudar a matéria ausente, os pesquisadores analisaram tanto explosões previamente observadas quanto novas descobertas feitas durante o desenvolvimento do estudo.
As 69 explosões analisadas estão localizadas em distâncias que variam de 11,74 milhões a impressionantes 9,1 bilhões de anos-luz da Terra. A mais distante, chamada FRB 20230521B, foi identificada durante a pesquisa e atualmente detém o recorde como a explosão rápida de rádio mais distante já observada.
A equipe utilizou a Deep Synoptic Array — uma rede com 110 radiotelescópios — para localizar e identificar 39 dessas explosões. Essa rede, projetada especificamente para rastrear a origem dessas emissões, está instalada no Observatório de Rádio Owens Valley, próximo a Bishop, Califórnia. Outros instrumentos importantes, como o Observatório W. M. Keck, no Havaí, e o Observatório Palomar, perto de San Diego, ajudaram a medir as distâncias entre as explosões e a Terra. As 30 FRBs restantes foram registradas por telescópios como o Australian Square Kilometre Array Pathfinder, entre outros distribuídos pelo mundo.